Assim como tem acontecido em casos de tributos estaduais, o Tribunal de Justiça de São Paulo vem recebendo inúmeros pedido de prorrogação do vencimento de impostos municipais em razão da epidemia do coronavírus. Os pedidos são apreciados pelas três Câmaras de Direito Público especializadas em tributos municipais: 14ª, 15ª e 18ª. O entendimento que tem prevalecido é o de negar as prorrogações.
Em três processos de relatoria do desembargador Geraldo Xavier, foram negados pedidos envolvendo IPTU e ISS. Para Xavier, as situações não se enquadram nos artigos 151 e 152 do Código Tributário Nacional. “A moratória tributária em caráter individual, como almeja a agravante, requer lei específica que a autorize, até o momento inexistente. E ao Poder Judiciário não é dado suprir a lacuna, sob pena de invadir seara alheia”, disse.
Xavier disse ainda que, embora a Portaria 12/2012 do Ministério da Fazenda permita o adiamento do pagamento de tributos em hipóteses de calamidade pública, “cuida-se de norma respeitante apenas a tributos federais, não abrangente dos estaduais, tampouco dos municipais”. Segundo o relator, não se pode conceder moratória sem previsão legal.
Por fim, o desembargador disse que a epidemia causa dificuldades econômicas que atingem a todos indistintamente. “Conceder benefícios fiscais a este ou àquele contribuinte, individualmente considerado, representa inadmissível privilégio, atenta contra a ordem republicana e subtrai do poder público recursos indispensáveis para equipar a rede de saúde pública e assistir os mais necessitados”, concluiu.
Princípio da separação dos poderes
Ao negar pedido de uma empresa para postergar o vencimento de todos os tributos municipais relativos aos meses de abril, maio e junho de 2020 para o último dia útil de março de 2021, o desembargador Kleber Leyser de Aquino disse que a concessão da medida violaria o princípio da separação dos poderes, previsto no artigo 2 da Constituição Federal.
“Não cabe ao Poder Judiciário substituir os administradores públicos do interessado na tomada de medidas de competência privativa deste, sob pena de violação ao princípio de separação dos poderes, bem como por não ter o Judiciário conhecimento e instrumentos hábeis para sopesar os distintos desafios e providências necessárias ao enfrentamento da Covid-19”, disse.
Em caso semelhante, Aquino negou a suspensão da exigibilidade de crédito tributário de uma empresa, por meio da concessão de novo prazo para o pagamento, pois, segundo ele, a medida “depende de ato normativo proveniente do interessado, pessoa jurídica de direito público competente para a instituição do ISS, ante a indisponibilidade do crédito tributário”.
Empresa em recuperação judicial
Uma empresa em recuperação judicial não conseguiu postergar o recolhimento do ISS e o vencimento das parcelas dos acordos firmados com a Prefeitura de São Paulo. A relatora do caso, desembargadora Silvana Malandrino Mollo, afirmou que, diante da ausência de anúncio formal do município a respeito do assunto, por ora, “a liminar almejada não pode ser deferida, sob pena de causar impacto fiscal danoso e irreversível, com prejuízo ao próprio interesse público” em tempos de pandemia.
Com o mesmo argumento de que o Poder Judiciário não pode conceder determinações nesse sentido, sob pena de comprometer o orçamento fiscal e causar danos irreversíveis ao erário, a desembargadora Silvana Malandrino Mollo também negou pedido de prorrogação do ISS de centros médicos e de diagnóstico de Sorocaba.
Rejeição de analogia com fato do príncipe
Para justificar a recusa de prorrogar os tributos municipais de uma concessionária de transporte público, o desembargador Raul De Felice disse que não há possibilidade de equiparação da relação jurídica tributária com uma relação contratual firmada entre particular e o Poder Público para “fins de equiparação analógica ao fato do príncipe, pois tanto o setor público, que depende da arrecadação de impostos para atender às necessidades da população durante a pandemia, quanto o privado, que passou a arrecadar menos receitas de consumidores, serão prejudicados”.
Assim, segundo Felice, os prejuízos decorrem da pandemia, e não de um ato emanado pela administração pública. “É incabível a intromissão do Poder Judiciário nas funções administrativas para sacrificar o ente tributante mediante determinação de renúncia de receitas no período para fins de equiparação ao dever de indenizar dos entes contratantes ou mesmo de imposição de moratória”, completou.
Falta de indícios de dificuldades financeiras
O desembargador Rodrigues de Aguiar, ao negar dois pedidos de empresas para suspender o pagamento do ISS, afirmou não haver “indícios probatórios suficientes que evidenciem a impossibilidade de pagar ISS das competências de março de 2020, resultante da redução de atividade e de receitas”. Para ele, as alegações das empresas são “genéricas” e não comprovam a “impossibilidade de adimplemento” do tributo.
Sem direito líquido e certo
Enquanto não houver lei específica, no âmbito municipal, sob pena de violação do princípio da legalidade estrita, que não se relativiza fora das hipóteses legais de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, não há como reconhecer qualquer ameaça de violação ao direito líquido e certo invocado pelo contribuinte. Esse entendimento foi aplicado pelo desembargador Rezende Silveira para rejeitar dois pedidos de empresas que buscavam a prorrogação do vencimento do ISS. Ele também disse que a concessão da medida viola o “princípio da supremacia do interesse público sobre o privado”.
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